É inevitável o encontro com cenários idílicos e pitorescos ao percorrermos as estradas que cortam a Provence. Campos de lavanda, de trigo, plantações de verbena, de ervas aromáticas e de plantas medicinais brotam dessas terras e nos colocam em contato direto com um modo de vida rural.

O tempo parece passar sem pressa nesta parte do sul da França e os princípios se condensam em um só: o cuidado com a terra e com as pessoas.

Em meio aos perfumes, aos sabores, às cores e às texturas que só a Provence tem, uma das lições mais significativas que aprendemos aqui é a relação de zelo entre o campo e os que dependem dele.

Quando visitamos a Provence percorremos, na verdade, uma região repleta de pequenas cidades que nos oferecem uma celebração em torno da boa mesa e hospedagens que nos conectam com a história e a vida local.

O sentimento de estar aqui nos remete ao interior, com a zona rural sendo o coração deste vasto território. E quem está no centro desta história são os pequenos produtores, os quais são motivados por preceitos sustentáveis e carregam o fator humano no processo – ingrediente que faz toda a diferença.

Além dos queijos, dos pães, dos embutidos e das outras delícias gastronômicas que abastecem as feiras livres da cidade de Aix-en-Provence e restaurantes locais, por exemplo, as plantas aromáticas também se destacam.

Os produtores

“Para nós, cuidar da natureza é algo essencial, que significa, por um lado, respeitar os vivos, então tentar, se possível, preservar o que já existe”, me conta o agricultor Philippe Mary durante nossa visita à sua propriedade.

Ele toca a fazenda junto de Magalie Mary, sua esposa, e a verbena nasce de suas terras. Arbusto típico da bacia do Mediterrâneo, a verbena é a mais cítrica e uma das mais aromáticas ervas da Provence.

A propriedade do casal é entremeada por bosques e florestas, num sistema que esbarra no conceito de agrofloresta. “Tentamos equilibrar os ambientes para que haja insetos, animais e plantas para que possam viver em harmonia. Tudo isso permitirá regenerar a vida e equilibrar um pouco o ambiente”, afirma Magalie.

Bastante apreciada na indústria dos cosméticos, a verbena plantada pelo casal é vendida para uma marca que também é filha destas terras. Refiro-me à L’Occitane en Provence, empresa que desenvolve produtos de beleza e fragrâncias naturais com óleos essenciais.

Sediada na comuna de Manosque, a 55 km de Aix-en-Provence, a L’Occitane en Provence tem contrato com diversos produtores locais – são 130 ao todo na França – que fornecem a matérias-primas para a empresa, a qual, ao mesmo tempo, destina uma atenção minuciosa a estes colaboradores.

“Com a L’Occitane en Provence temos uma relação privilegiada. Eles levam isso em consideração e nos pagam muito bem pelo trabalho que fazemos e, portanto, nos permite produzir uma boa verbena em Provence”, revela Philippe.

A L’Occitane en Provence

L’Occitane foi fundada em 1976 pelas mãos de Olivier Baussan com uma produção voltada aos sabonetes / CNN Viagem & Gastronomia

Desde que foi fundada em 1976, a L’Occitane en Provence tem como motor a sustentabilidade e o olhar atento à biodiversidade. O cuidado com o ingrediente, desde sua origem, é visto de perto e melhor entendido quando pisamos de fato na Provence.

Ao vagar pelas plantações daqui, sentimos aromas e atrelamos histórias. Assim, digo que a L’Occitane en Provence traduz esta terra por meio de seus produtos.

Fundador da marca, Olivier Baussan tem, desde os primórdios da empresa, a responsabilidade em olhar para as pessoas e para o meio ambiente ao redor, os quais possibilitam transformar as riquezas deste solo em cosméticos admirados pelo mundo.

“A ideia da L’Occitane no início eram as plantas. Então era para captar o que estava nas plantas e poder oferecer ao público”, relata o fundador em conversa pela sede da marca em Manosque enquanto gravava o CNN Viagem & Gastronomia.

Hoje, após quase 50 anos de história, a empresa tem em seu portfólio principal perfumes e produtos de beleza, os quais são fabricados no sul da França e vendidos em cinco continentes, em mais de 1.500 lojas próprias em 90 países.

“Tenho uma frase que gosto muito de dizer: o importante é saber oferecer às pessoas em pé o que só se encontra de joelhos. Você tem que saber ser humilde e respeitoso e, ao mesmo tempo, saber mostrar produtos, indo buscar dos mais velhos receitas antigas para poder dizer: ‘bem, aqui estamos associando o passado e o presente’. E a melhor forma de respeitar o futuro é entender o passado”, completa Baussan.

L’Occitane en Provence

Lar de cerca de 20 mil habitantes, a comuna de Manosque, a quase 35 minutos de carro de Aix-en-Provence, mantém um caráter bem provençal, principalmente em seu centrinho pacato, o qual conta com casinhas e construções que parecem ter saído de um filme.

A fábrica original da L’Occitane fica aqui, no entorno da cidade, e nos reserva um mergulho pelas práticas e pela história da marca. A sede abrange fábrica, um jardim mediterrâneo e loja-museu com os cosméticos da empresa.

Para quem deseja conhecer mais sobre os processos que as plantas passam desde a colheita no campo até se transformarem em óleos essenciais e consequentemente em cremes, sabonetes e perfumes, a visita guiada à fábrica é uma boa pedida.

Somando 48 mil m² de área e empregando cerca de 800 funcionários, a fábrica é dividida em diferentes espaços, e o passeio nos leva até oficinas de produção, onde podemos checar como as fórmulas são combinadas, como os produtos são manufaturados e até como são embalados – são cerca de cinco milhões de unidades embaladas por ano.

Há também uma área onde podemos cheirar algumas fragrâncias e perfumes. Com duração de uma hora, o tour custa cerca de 5 € por pessoa em grupo – a tarifa individual sai por 6 €.

As visitas acontecem sete dias por semana de abril a outubro e de segunda a sábado de novembro a março.

Daniela Filomeno no jardim mediterrâneo da L’Occitane, que possui espécies selvagens e cultivadas / CNN Viagem & Gastronomia

Logo em frente à fábrica fica o jardim mediterrâneo, um espaço natural repleto de espécies selvagens e cultivadas que despertam nossos sentidos.

Algumas delas, como a lavanda, a verbena e as amêndoas, são usadas nos cosméticos da empresa e nos fazem relembrar o cuidado com a origem e com a matéria-prima estabelecida pela L’Occitane.

“Na verdade, quando falamos de biodiversidade sempre falamos de natureza, por um lado, e de agricultura. Quando estamos emum lugar como aqui, podemos ver que aqui é selvagem, aqui é cultivado. E, de fato, tudo funciona junto”, frisa Jean Charles Lhommet, diretor de biodiversidade e de ingredientes sustentáveis da L’Occitane.

Em consonância com o que a empresa de fato prega e realiza, ele ressalta que os produtores têm um papel intrínseco no processo.

Não se trata apenas da lavanda. É a lavanda e o conhecimento dos agricultores e uma paisagem que é magnífica porque está integrada à natureza

Jean Charles Lhommet

A lavanda, inclusive, é, por muitas vezes, referida como o “ouro azul” da Provence, tamanho impacto dos famosos campos na economia local e também no turismo. Para os que quiserem de fato visitar abastados campos de lavanda – e de quebra registrar belos cliques – a dica é dirigir até Valensole.

Distante aproximadamente 10 minutos da fábrica, a pequena comuna abriga o plateau de Valensole, que são os campos de lavanda de acesso livre e que exalam perfumes acolhedores. Todos os verões, as plantações florescem e encantam os milhões de turistas que passam por aqui.

Daniela Filomeno entre campos de lavanda da Provence, considerada o “ouro azul” da região / CNN Viagem & Gastronomia

Passado, presente e futuro

A fábrica da L’Occitane em Manosque ainda abriga uma loja-museu com todas as linhas da marca. Dispostos nas prateleiras, alguns produtos também nos narram a história da L’Occitane, como os primeiros sabonetes, cremes e cosméticos com os óleos essenciais.

Para os animados com as compras, uma boa notícia: todos os produtinhos possuem 10% de desconto em relação aos outros estabelecimentos oficiais da marca.

Daniela Filomeno na loja da fábrica da L’Occitane em Manosque / CNN Viagem & Gastronomia

Por falar em passado, do lado de fora fica a engenhoca original que Olivier Baussan usava no campo de lavanda: é um destilador a vapor que extraía o óleo essencial puro, a “alma da planta”, segundo o fundador – há até uma foto ao lado da máquina em meio à plantação para que possamos ter uma ideia de como era feito o trabalho.

“É a obsessão de nossa marca de sempre entender melhor a natureza, para trazer o melhor depois dentro de nossos produtos”, diz Nicolas Geiger, CEO da L’Occitane en Provence para as Américas.

Na visita ao jardim da fábrica, ele me contou sobre a atenção redobrada que a empresa tem com os ingredientes que saem da região.

“Todas as nossas linhas se baseiam sobre ingredientes. Porque a qualidade da matéria-prima é essencial para ter um produto de qualidade”, completa.

Para o futuro, Olivier Baussan me contou que a ideia é ampliar a concepção da fábrica para que o entorno se torne um circuito turístico. A adição de um jardim de borboletas está nos planos: além de belas, a intenção é mostrar o impacto destes insetos na polinização.

O circuito ainda pretende abranger um château próximo, um jardim medieval e ainda uma fábrica de caramelo. Mas por que caramelo?

“O caramelo é uma tradição antiga de confeiteiro, e a Provence fazia muita confeitaria, e fazia também muito caramelo. Há os berlingots (doce típico francês), massas de frutas, torrones e caramelos”, explica Baussan, que já possui uma máquina de 1968 para a produção do doce.

Seja em meio aos aromas da Provence ou até mesmo com seus doces, fato é que a região nos encanta nos mínimos detalhes, assim como o tratamento e o tato com a terra nos conecta a um modo de vida mais simples: sem pressa e com muita elegância.